-Aqui você vai ler uma parte do capítulo 1 de Dose de Vingança.
-Também lerá alguns trechos do livro, acompanhado das músicas que inspiraram cada uma dessas partes.
Preparado? Aponta, FOGO!
Capítulo 1
Criado pela Violência
Cidade de Thombstone – 503... 501
habitantes – 1873
Um estrondo acompanhado pelo
estilhaçar de vidros se quebrando acordou o menino Jack de supetão. Deitado
numa cama dura forrada de palha, no minúsculo quarto com paredes de madeira
velha, a criança de dez anos olhou assustada para uma mulher com pouco mais de
quarenta anos agachada debaixo de sua janela, com vista para o quintal. Ela
usava um rifle winchester nas mãos.
- Mãe! – reclamou Jack.
Reclamou como reclamava quase todos os
dias, quando situações como aquela aconteciam desde que ele se entendia como
gente.
- Diiia filho. – cumprimentou Jane com
um sorriso, que lhe faltava dois dentes.
Outra bala entrou pela janela e furou
a bandeira dos Estados Confederados pendurada na parede oposta. A mulher
levantou-se e disparou três vezes como resposta.
- Morre seus bandos de esterco de
cavalo manco! – gritava ela. – Desculpa te acordar meu filho, mas os diachos
dos Rojos começaram cedo hoje.
- Rojos?! – perguntou Jack sentando na
cama alheio aos projéteis que penetravam pela janela e pelas frágeis paredes do
quarto. - Não eram os Braxter, que vinham causando problema?
-Vish! Naaada. Os Braxters sossegaram
o facho depois que os Rojos empacotaram o filho mais véio deles. Agora a batata
assô foi com os Rojos.
A guerra entre as três famílias: Rojos,
Braxters e Davis já durava dez anos, desde o fim da Guerra de Secessão que
dividiu o país ao meio. A maioria dos homens daquelas famílias havia lutado na
guerra ao lado dos Confederados, mas agora eram inimigos mortais. O motivo pelo
qual se odiavam, ou o que iniciou aquela pendenga, ninguém mais sabia, mas não
importava.
A violência era cotidiana na pequena
Thombstone, com cerca de quinhentos habitantes variando para mais ou para menos
dependendo do momento e do estado etílico dos atiradores. Quando não eram as
três famílias se matando, a violência era aquela típica de uma região de fronteira,
em um país que se expandiu rápido para o oeste. Os Fora-da-lei na estrada,
confrontos com índios e todo tipo de confusão eram naturais naquelas terras,
além da tradicional guerra entre famílias. Melhor que isso só uma boa briga de
bar.
Jack bocejou sonolento enquanto
esticava os braços numa boa espreguiçada aparentemente dicotômica com o cheiro
de pólvora no ar, os cartuchos e destroços espalhados pelo chão e o som de
tiros distantes, prontamente respondidos por Jane Davis rindo e xingando o
tempo todo. Isso poderia realmente parecer estranho a um observador externo,
mas, por essas bandas, nada é mais tradicional.
O garoto cruzou a porta do quarto que
dava acesso a uma sala não muito maior do que o cômodo anterior. Nela havia
pratos empoeirados enfeitando a parede, uma mesa com restos de comida, que
pareciam estar ali há pelo menos três dias, um sofá com estofamento rasgado,
onde um cachorro vira-lata velho dormia profundamente. Ao lado do sofá, numa
cadeira de balanço, um homem com mais de sessenta anos, exibindo uma longa
barba branca e pontuda, acompanhava o sono do cão roncando alto, mesmo com o
cachimbo babado na boca.
Um imenso gambá passou correndo por
entre as pernas de Jack, ao mesmo tempo em que uma senhora gorda saía pela
porta lateral que ligava a sala à cozinha. Ela carregava uma machadinha
enferrujada e esbravejava agitando os braços.
- Pega o bicho! Ta fugindo nosso
rango!
Jack se abaixou, mas o animal foi
muito mais rápido do que ele e passou por entre suas pernas, correu em direção
à porta aberta e antes de ganhar a liberdade derrubou a escarradeira de metal
que jazia cheia até a boca ao lado da cadeira de balanço do vô Davis.
- Mas que catiça! – gritou a vó Davis.
- Vó – chamou Jack ignorando o
amaldiçoar do animal sortudo. – Onde está o pai?
- Tá no quintal trocando bala com os vizinhos
lá de cima.
Jack cruzou a sala, levemente
abaixado, já que ocasionalmente um projétil atravessava o cômodo alojando-se na
parede e criando mais um buraco da coleção de marcas de bala que existiam na
parede. O menino olhou pela porta e viu a figura inconfundível de seu pai
segurando em uma das mãos o revólver 38 de tambor e na outra, uma garrafa de
algum destilado fabricado no quintal dos fundos, cujo rótulo de cortiça exibia
três letras “X”.
Sam Davis era o nome do homem que ria,
bebia e atirava completamente exposto à própria sorte. Ostentava um grosso
bigode que se juntava à barba deixando o queixo nu. Na cabeça tinha um chapéu
de cowboy, que Jack nunca o vira sem, e nos pés inseparáveis botas de couro tão
velho que o pé esquerdo expunha um buraco, deixando o dedão feio de Sam à
mostra.
O pai de Jack estava embriagado. Mas
isso é como dizer que o deserto é quente e o cacto tem espinhos. O garoto não
sabia se Sam havia bebido a noite toda sem dormir, ou apenas começara logo pela
manhã, mas pouca diferença isso fazia. Jack o preferia assim, pois quando
estava sóbrio, sua violência tornava-se mais eficaz, além de descontar suas
frustrações na própria família.
- Paaai! – chamou Jack com a entonação
característica da região sul.
O homem se virou com os braços
abertos, ainda gargalhando. Então uma bala quebrou a garrafa em sua mão, passou
zunindo pelo ouvido de Jack e entrou na casa arrancando o cachimbo da boca do
vô Davis que só então acordou gritando:
- Os yankees estão atacando! Mata!
Mata! Ninguém vai libertar meus escravos!
- Do que cê ta falando fiote de cruz
credo! – era a vó Davis. – Você nunca conseguiu ter um negrinho sequer!
- Pode ser! – continuou a gritar o
velho indignado. – Mas na minha época eu pelo menos podia ter um! – e começou a
cantar – Deus salve o sul! Seus lares e altares! Deus Salve o sul!
Ao som de God Save de South, hino dos Estados Confederados, e nervoso pelo
desperdício de uma boa bebida ruim, Sam Davis atirou com vontade contra seus
inimigos acabando por expulsá-los de seu quintal.
- É meió chisparem daqui, seus
galinhas! – gritou Sam rindo a vontade. – Agora vem cá muié que nós vamos enchê
o barde até distripá o mico!
Assim amanheceu mais um dia em
Thombstone. A cidade era dividida em três, o que poderia parecer um absurdo para
um observador de fora, pois tinha apenas uma rua de terra, com pouco mais de
quinhentos metros de comprimento. Na parte de baixo da rua ficava a propriedade
dos Davis e seus aliados. No meio estavam os Braxters e os Rojos, os mais
ricos, ficavam no alto da rua. A cidade, que parecia não ter nada, tinha o
essencial para as necessidades daqueles homens e mulheres esquecidos por Deus:
uma prisão, com uma única cela, onde normalmente ficavam trancafiados
forasteiros – bandidos ou não – e onde também estava o xerife, escolhido entre
os mais bêbados e gordos da cidade. Havia também a Igreja e o cemitério, onde
trabalhava o homem mais feliz da cidade: o fabricante de caixões. A Igreja era
o lugar neutro, assim como o saloon, mas o primeiro ninguém gostava - apesar de
frequentarem assiduamente em razão dos constantes velórios e missas de sétimo
dia - e o segundo era lugar certo onde encontrar quem quisesse da cidade, todas
as noites.
O fato do saloon ser respeitado como
terreno neutro não significava ausência de violência, apesar de raramente
alguém morrer lá dentro. No saloon você não era respeitado se não saísse de lá
completamente bêbado e se não tivesse arrumado uma confusão qualquer.
E
assim cresceu o pequeno Jack. Numa família violenta, de uma cidade violenta,
numa época violenta. (...)
Trechos de Dose de Vingança - livro
Trecho 1
Assim
terminava o primeiro dia livre do fora da lei de Thombstone. Com um massacre
Dashville.
Trecho 2
Jack
(...) se levantou ainda tonto, sentindo o gosto amargo de
álcool na boa, uma cede insaciável e uma forte dor de cabeça. Quando levou a
mão à nuca sentiu uma grande quantidade de sangue seco, o que explicava
parcialmente a dor fora do comum.
Trecho 3
-
Está procurando isso, Jack? – disse Ben, lhe devolvendo o 38 perdido.
-
Ai caralho. – exclamou Jack.
-
Porra Jack, não estava me ouvindo? Não lembra de ontem?
-
Não me lembro de nada e nem quero saber o que fiz. Mas ocê? O que tu tá fazendo
aqui?
-
De novo?! Já te contei tudo!
-
Eu não lembro de nada, imbecil.
- Ha ha ha, velho Jack. –
riu Ben. – Eu conto de novo, não tem problema.
Trecho 4
Em sua primeira ação, como matador de aluguel contratado por Boca del Diablo, Jack entrou, vestido com sua velha roupa suja de cowboy, num baile da alta classe e atirou contra um homem que jogava blackjack. Enquanto todos os presentes olhavam assustados, Jack, que ainda segurava a arma fumegante, se aproximou da vítima e revelou suas cartas, ainda sujas de sangue. Elas somando 21 com as da mesa.
– Ganhou. – disse e foi embora.
Trecho 5
Ben ia falar alguma coisa inútil para consolar Jack, mas foi interrompido por dois homens que se aproximaram do último Davis, cercando-o de ambos os lados.
- O cavalo branco solto na rua é seu? – disse o homem que carregava no peito uma estrela dourada de xerife.
Sem pressa Jack bebeu mais uma dose de seu rum e respondeu.
- É sim, por quê?
- Essa rua tem dono, forasteiro. – disse o outro homem. – Se não tirar aquele pangaré de lá, você vai morrer.
Jack se levantou. Encarou o homem encostando sua testa na dele e com uma expressão mal encarada, que poucos conseguiriam suportar.
Foi quando, na mesa ao lado, um homem levantou e quebrou a pesada cadeira no garçom que servia alguns petiscos. O sangue voou longe...
- Espera, espera... – Jack interrompeu o relato . – O que esse homem batendo no garçom teve haver com a nossa confusão?
- Nada! – riu Ben. – Mas me deixe continuar...
Naquele exato momento, sem largar a garrafa cheia, Jack pegou a primeira coisa que alcançou (um garfo de ferro na sua mesa) e enfiou no peito do homem, que o encarava. O xerife, que teve a atenção desviada pela súbita briga do outro lado, quando viu seu amigo caído com o peito sangrando, tentou reagir, mas era tarde. A garrafa de rum que Jack bebia lhe acertou em cheio na têmpora, produzindo um som do crânio se quebrando, enquanto o sangue espirrou abundante em Jack e Ben.
- Um verdadeiro pandemônio. – completou Ben.
Trecho 6
Jack empurrou Bem impedindo que recuasse. Havia
naquela música algo estranho, quase que sobrenatural. O grupo tocava uma música
country com uma batida diferente, mais rápida, que dava àquele cenário caótico
um ritmo ainda mais acelerado.
(...)
O morto caiu em cima de uma mesa onde permaneceu esquecido,
enquanto ao seu redor vários homens com uniforme listrado, típico de
prisioneiros, alguns deles ainda com correntes amarradas nos tornozelos, bebiam,
atiravam para o alto e gritavam batendo o pé no ritmo frenético da música.
(...)
No alto estava o indiscutível dono daquela
terrível festa. O embaixador do diabo na terra, o Maluco Willy.
Trecho 7
-
Cê nunca sorri, pequeno Jack? – perguntou o velho taverneiro para o homem que
enrolava seu fumo na ceda e acendia o cigarro. – Nem com uma boa bebida num dia
de festa?
-
No dia que toda essa gente tiver comendo minhoca... – respondeu Jack saboreando
a fumaça fedorenta. – Talvez dê pra sorrir.
Trecho 8
O
velho de barba branca cerrada era conhecido por todos apenas como Ryden, o
maior apostador que já se viu. Fora preso há muito tempo, depois de matar um
engraçadinho que tentou lhe roubar no jogo, e de lá nunca mais saiu.
Trecho 9
No dia que Jack, acompanhado por Ben, chegou ao
local, lhe perguntaram quem ele era.
- Buffalo Red. – respondeu. - Jack Buffalo Red.
Trecho 10
O religioso iniciou uma oração, esticando as mãos
em direção aos condenados, e recitando termos em latin que ninguém entendia,
mas sempre impressionava. Nesse momento, Jack pediu para que ele se
aproximasse. O reverendo sorriu, diante da possibilidade de um arrependimento
público do bandido. Seria a vitória da fé e, certamente, um passo decisivo para
uma promoção. Por isso se aproximou dizendo:
- O cruel assassino deseja perdão, quando o
inferno lhe abre as portas bem debaixo de seus pés. – disse o reverendo,
olhando a multidão, para sentir o impacto de suas palavras.
Foi quando Jack simplesmente cuspiu no rosto do
religioso, dizendo.
- Eu sempre vivi no inferno. – disse.
Trecho 11
Foi então que o show foi interrompido por um
homem que chegava suando exasperado, montado em um cavalo quase morto pelo
cansaço. A multidão abriu caminho e ele se dirigiu diretamente ao Sr. McKinley
ao qual, ofegante, falou:
- Patrão! – dizia ele. – Não sei nem como lhe
dizer. São centenas, talvez milhares! Vindos pelo rio, pelo alto da estrada, e
pelo o pasto.
- Do que
você está falando homem?! Desembucha! -disse o xerife, com um sorriso nervoso.
Foi então que uma gargalhada sinistra se ouviu.
Para começar, só quem estava perto do palanque ouviu, mas, conforme ela foi
aumentando de tom, todos os que estavam lá para assistir a execução, ouviram e
olharam para os lados, tremendo de medo, ainda sem identificar de onde vinha.
Até que o índio, aparentemente desmaiado, se levantou lentamente, diante dos
olhares apavorados de todos. O vento soprou mais forte, arrastando a poeira do
deserto e provocando um barulho perturbador, antes do cacique começasse a
falar.
- Vez minha. – disse e sua voz soava grave e
sinistra. Com o inglês carregado continuou. – Vocês porcos ouvir bem. Diz amar esta
terra, tudo bem. Daqui não vai sair ninguém.
Trecho 12
"Um estrondo acompanhado pelo
estilhaçar de vidros se quebrando acordou o menino Jack de supetão. Deitado
numa cama dura forrada de palha, no minúsculo quarto com paredes de madeira
velha, a criança de dez anos olhou assustada para uma mulher com pouco mais de
quarenta anos agachada debaixo de sua janela, com vista para o quintal. Ela
usava um rifle winchester nas mãos.
- Mãe! – reclamou Jack.
Reclamou como reclamava quase todos os
dias, quando situações como aquela aconteciam desde que ele se entendia como
gente.
- Diiia filho. – cumprimentou Jane com
um sorriso, que lhe faltava dois dentes.
Outra bala entrou pela janela e furou
a bandeira dos Estados Confederados pendurada na parede oposta. A mulher
levantou-se e disparou três vezes como resposta."
Trecho 13
"Um bafo quente cheirando a sangue,
suor e álcool, soprou de dentro do recinto, quando Jack entrou naquele
verdadeiro inferno e caminhou lentamente para seu lugar de costume junto ao
balcão. Ao redor seguiam as conversas alteradas, escarros no chão e bebida
descendo como água nas mesas onde se jogava carteado. De repente, um estampido
e uma garrafa se quebrou próxima a cabeça do taverneiro que não esboçou nenhuma
reação. O tiro foi dado pelo padre da cidade comemorando uma boa aposta no
Black Jack enquanto um grupo ao lado acabara de virar dois barris de cerveja
diretos na boca.
O lugar onde sentava o último Davis
estava ocupado por um velho, muito velho – coisa rara entre os homens da
região. Mas não era um velho qualquer. Era um dos fundadores de Thombstone que
Jack o arremessou para fora do banquinho. Onde fora derrubado permaneceu sem
alterar seu descanso merecido.
Tudo transcorria na mais perfeita
confusão. O taverneiro jogou uma dose coiote de whisky vagabundo para Jack e já
enchia o segundo copo enquanto ele virava a bebida e limpava com a costa da mão
os restos escorrendo pela vasta barba."
Trecho 14
"Jack era um deslocado. Na sua família fora, na sociedade era e não fazia questão de não ser. Caso lhe perguntassem se odiava negros, responderia que sim pela força do hábito, mas a verdade é que não gostava igualmente de ninguém. Debbie foi a primeira pessoa, não branca, que ele interagira – mesmo que de uma forma pouco amistosa – e talvez isso explicasse seu estranho interesse."Trecho 15
"Para
não dizermos que absolutamente nada mudou na cidade, a maior novidade foi o
bordel aberto ao lado da igreja. O empreendimento foi do único homem que, de
fato, prosperara por todos aqueles anos: Fred White, o fabricante de caixões.
No letreiro da casa lia-se “dançarinas francesas”, mas não era preciso ser um
homem viajado para perceber que se tratava de quatro mexicanas vestidas da
forma que Fred julgava ser a moda de Paris e forçando um sotaque com biquinho
nos lábios. Esse detalhe não tirava o orgulho dos habitantes de Thombstone que
confirmavam para qualquer forasteiro a história das meretrizes francesas."
Trecho 16
"- Junte-se ao clube Jack!!! – gritou
um jovem com um copo de cerveja numa das mãos e na outra escorava a dançarina
mexicana sentada em seu colo fingindo achar graça de tudo.
Jack entrara no cabaré de Fred White.
O lugar não era muito maior que seu próprio barraco. Do outro lado da porta,
que abria tanto para frente quanto para trás, estava um minúsculo palco onde as
dançarinas ficavam se exibindo com roupas francesas que fariam qualquer francês
cair na gargalhada. Do lado direito, um bar apertado ficava um garoto com não
mais de treze anos servindo as bebidas e no centro do lugar havia três mesas.
Apenas uma estava ocupada por três rostos conhecidos de Jack, mas que ele
fizera questão, ao longo de toda sua vida, de jamais trocar uma palavra. Porém
lá estava ele novamente fazendo algo que nunca imaginou fazer.
-
Fred falou que tu vinha! – gritou um velho com apenas um dente e uma barba
longa e branca, que bebia mais da cerveja do que o próprio homem.
Ele
também tinha no colo uma das meretrizes, mas logo dispensou reclamando que suas
pernas já não aguentavam mais, para alívio da mexicana. Então cuspiu certeiro
numa escarradeira de metal fazendo-a ressoar como um sino e continuou a falar
com Jack.
-
Vem aqui que vou te dar de lambuja algumas dicas pra tu afroxá sua coleira.(...)
- Ouve bem. – repetiu o velho passando
a língua na gengiva sem dentes. – Tu vai chegar tarde e ela vai querer sabe o
puiquê. Aí cê responde tudo sem ersitá. Tem que tê as palavras na ponta da
língua.
-
Mas do que tu tá falando, véio!? – zombou o terceiro homem.
Este
era tão gordo, que o banquinho que sentava praticamente desaparecera entre suas
enormes nádegas. Não havia nenhuma dançarina com ele, pois Fred White o
proibira de sentar-se com elas no colo, depois de ter quebrado três daqueles
bancos. No rosto redondo exibia um bigode fino semi escondido entre o enorme
nariz e os lábios descomunais.
-
Sua mulé já bateu as botas faz anos. – disse o gordo."
Matanza - Clube dos Canalhas
Trecho 17
"De todos os ensinamentos que Ryden lhe deu, jogar foi o que Jack mais valorizou. Era o vício que lhe faltava na vida. Antes da prisão, achava que jogar era uma perda de tempo e de dinheiro que poderia estar sendo gasto com bebida e cigarros. Além disso, proporcionava a odiosa necessidade de se relacionar. Mas agora ele pegara o gosto pela emoção da carta surpresa, o blefe, a adrenalina da aposta e percebeu que se tornara bom nisso. Além do mais, poderia ser mais uma arma para humilhar alguns panacas."
Matanza - As melhores Putas do Alabama
Trecho 18
"Ele então ergueu seu cantil e todos os
prisioneiros fizeram o mesmo. O som de dezenas de vozes se elevou do presídio
para o ar quente do deserto."
Matanza - Tempo Ruim
Trecho 19
"Diferente também de outras cidades isoladas, como fora Thombstone, sua população já estava acostumada com forasteiros que iam e vinham pela estação de trem da cidade. Por isso, os únicos olhares de desconfiança eram lançados a Debbie e tinham a ver com o puro preconceito racial daquela gente. O casal parou em um lugar onde havia uma placa escrita saloon ao lado de outro estabelecimento onde estava escrito “Banco”.
- É aqui que vamos nos embebedar? –
perguntou Jack.
Debbie apenas sorriu e disse:
- Espera por mim.
Jack nem saltou do lombo de Pé-de-Pano
e ficou observando a movimentação de Dashville.
(...)
Mas Jack já não prestava atenção em
nada disso. Sua experiência dizia que havia algo errado... Ele não teria dito
“errado”, mas certamente havia uma movimentação estranha no Banco e isso se
confirmou quando começou o tiroteio.
Debbie saiu do local virada de costas
para a rua e atirando para dentro do estabelecimento. Em sua mão estava um saco
de dinheiro, que jogou para Jack. O barbudo segurou o saco com uma das mãos e
com a outra ele já sacava o revólver e apontava na direção dos policiais do
outro lado da rua."
Trecho 20
"Jack então colocou sua calça de couro,
a camisa xadrez por debaixo de uma jaqueta de couro, o cinto com o seu velho
revólver, munição e o chapéu que fora de seu pai. Até aí nada que ele devesse,
de fato, se preocupar. Foi quando pegou sua bota que percebeu que havia algo
muito errado.
Inconfundível, bem no bico de sua
velha bota havia um buraco de bala. Inconfundível era também a mensagem dada.
Debbie havia partido... De novo. E para piorar, ela roubou seu cavalo.
- Que diabo de mulher! – resmungou o
grosseirão."
Trecho 21
"Era o tipo de sujeito soberbo, metido
e orgulhoso sem ter qualquer razão para ser nenhum dos três. Recebera uma
grande herança do tio-avô falecido e agora gastava seus últimos tostões. Ele
avançou muito naquela mesa de pôquer de um pequeno cassino da costa leste, mais
pela incompetência de seus adversários (entre eles Ben), do que por sua própria
perícia.
(...)
(...)
O adversário deu mais um sorriso,
soltou outra piada e jogou todas as fichas na mesa.
- All in. – riu olhando diretamente
para o temível barbudo.
- Ei Jack. – chamou Ben se aproximando
de seu ouvido. – Sei não, heim cara! Ele parece confiante. Não é melhor sairmos
com o que ganhamos?
- É melhor esse imbecil aproveitar
agora e sorrir bastante. Daqui a pouco vai tá chorando sem nada.
- Porra Jack... A gente vai perder
tudo.
- Sei quando ele blefa. Na verdade é
muito fácil de perceber. Eu tenho um four de reis e esse cara não deve ser nem
uma dupla alta.
As últimas duas cartas foram abertas
na mesa e os adversários mostraram suas mãos. Houve vibração de todos ao redor
da mesa, menos de Jack e do seu adversário que colocou a mão na cabeça e
começou a chorar."
Trecho 22
"- Deixa
comigo patrão... – o homem então se adiantou na direção do cacique. Ele sorria
encarando o índio que manteve o olhar. – É natural que haja opiniões
diferentes. Como eu estava lhe dizendo, maldito índio sujo saia já daqui!
Dito
isso, ele socou o estômago do velho índio, que se curvou de dor. Dois outros
homens chegaram e continuaram a espancar o homem enquanto Jack, o empresário e
Ben olhavam a cena.
- Traz o
marcador de gado! Ele não vai aparecer aqui de novo. – falou um dos capangas e
assim foi feito."
Trecho 23
"- Me traga o gim! – gritou para a
taverneira.
Vários olhavam torto para ele, mas
surpreendentemente Jack não estava nem aí. Só queria saber de ficar bêbedo o
mais rápido possível, enquanto remoía suas dores, pois era incapaz de
externa-las. Sempre achou ridículos os velhos bebuns que se ancoravam ao balcão
do bar e choravam suas mágoas para quem quisesse - e não quisesse - ouvir. Mas
agora os invejava. Pensou que se pusesse para fora tudo aquilo que estava
sentido, talvez a dor diminuísse. A questão era sua completa incapacidade de
verbalizar e expressar de uma maneira geral qualquer tipo de sentimento.
- Taverneira! – chamou de novo.
A mulher branca de cabelo preto preso
por um coque, bochechas rosadas e seios fartos se aproximou sorrindo e se
inclinou ao falar com Jack revelando ainda mais do que já revelava seu grande
decote.
- Sim, peludinho. – disse ela
sorrindo.
Jack lhe encarou como encarava tudo e
qualquer situação da vida.
- Traga vinho – falou finalmente,
vendo que já esgotara o gim.
A taverneira prontamente lhe atendeu e
foi embora sem mostrar chateação."
Trecho 24
"- Entendo, mas hoje você foi um pouco descuidado. Muita gente importante ao mesmo tempo. Se não fugir agora estará condenado.
- Então
me traz o seu melhor whisky, antes que o diabo descubra que morri.
O homem
sorriu e lhe serviu uma dose. Jack preparou um cigarro e acendeu apreciando o
momento.
- Nada
melhor que passar as últimas horas com o melhor amigo.
- Você
está falando do cigarro, não é? – concluiu Ben, que também fumava e bebia.
- Mas é
claro, de quem mais. – respondeu e se permitiu um sorriso."Trecho 25
"O trio
fora-da-lei assaltou bancos, dilapidou bens, explodiu pontes e sumiu da
história para virar mais uma das milhares de lendas do velho oeste selvagem. Juntos
tornaram-se Carvão, Enxofre e Salitre."
A história e a arte estão ótimas!
ResponderExcluirOpa!
ExcluirQue bom que gostou.